E se fosse ao contrário?
- Daniel Silva
- 29 de set. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 30 de set. de 2020
Começo voltando ao nosso ultimo encontro, em que falei de racismo reverso, uma criação do mundo branco. O tema ainda está repercutindo muito na internet.
Recentemente as redes sociais foram tomadas por opiniões diversas. Já que a varejista Magalu, abriu vagas de trainee exclusiva para negros, isso dividiu opiniões na internet, internautas e até artistas se pronunciaram, alguns a favor, outros contra e a frase mais lida foi “E se fosse ao Contrario?”
Tivemos até o cantor e musico Roger (Vocalista e Guitarrista da Banda Ultraje a Rigor) que se manifestou no Twitter “... Se eu precisar de uma empregada e anunciar que só aceito pretas, estarei lacrando ou sendo racista?”.

É fácil identificar o racismo na frase acima. Olhamos para a pessoa negra e já a vemos ocupando espaços considerados de subemprego pela sociedade, nunca em uma posição de destaque.
Sobre racismo reverso citarei um trecho do livro da filosofa, escritora e autora Djamila Ribeiro e o capitulo carrega o subtítulo “Falar em racismo reverso é como acreditar em unicórnios” e ela ainda complementa:
Para haver racismo reverso, precisaria ter existido navios branqueiros, escravização por mais de trezentos anos da população branca, negação de direitos a ela. Brancos são mortos por serem brancos? São seguidos por seguranças em lojas? Qual é a cor da maioria dos atores e apresentadores de TV? Dos diretores de novelas? Da maioria dos universitários? Quem detém os meios de produção? Há uma hegemonia branca criada pelo racismo que confere privilégios sociais a um grupo em detrimento de outro.
- Djamila Ribeiro, 2018 - Quem tem medo do feminismo negro?
Agora pretendo adentrar a frase que mais me chama a atenção e carrega o titulo dessa matéria “E se fosse ao contrario?”. Eu trarei alguns autores que provam em suas obras como por séculos foi ao contrario.
O Professor e Dr. Ramatis Jacino, em um dos seus últimos livros Desigualdade Racial no Brasil, ele traz um capitulo “Trabalho como privilégios de brancos” e ele inicia:
Anúncios em jornais, na segunda metade do século XIX, com destaque para o período estudado, indicam ter havido um movimento de expulsão do negro do trabalho, concomitantemente ao aumento da pressão de outras etnias por qualquer ocupação que lhes garantisse a sobrevivência.
– Ramatis Jacinto, 2019 – Desigualdade Racial no Brasil
(Causas e consequências) Pag.106
O brilhante Professor Clovis Moura, em seu livro “Sociologia do negro no Brasil” nos mostra como as classes dominantes após a abolição excluíram os negros do mercado de trabalho:
Como vemos, a estratégia racista das classes dominantes atuais, que substituíram os senhores de escravos, conseguiu estabelecer um processo de imobilismo social que bloqueou e congelou a população negra e não branca permanentemente em nível nacional.
E mais a frente ele continua:
O auge da campanha pelo branqueamento do Brasil surge exatamente no momento em que o trabalho escravo (negro) é descartado e substituído pelo assalariado.
- Clovis Moura, 2 edição 2020 – Sociologia do Negro no Brasil (Pag. 108 e 109)
Nos trechos citados acima são para nos elucidar e mostrar o caminho que percorreu as relações trabalhistas após abolição. O negro foi colocado de canto, em busca a jornais da época não será difícil encontrar anúncios que excluíam pessoas negras das relações de trabalho e quando as contratavam geralmente era para subempregos, com o intuído de ganharem menos.
Sobre subempregos o Advogado, Filosofo e Pós Dr em Direito Silvio Almeida em seu mais conhecido e divulgado livro Racismo Estrutural diz:
Poder-se-ia dizer que o racismo normaliza a superexploração do trabalho, que consiste no pagamento de remuneração abaixo do valor necessário para a reposição da força de trabalho e maior exploração física do trabalhador, o que pode ser exemplificado com o trabalhador ou trabalhadora que não consegue com o salario sustentar a própria família ou o faz com muita dificuldade, e isso independente do numero de horas que trabalhe.
– Silvio Almeida, 2019 Racismo Estrutural (Pag. 172)
Trago todos esses referenciais para mostrar a você leitor como sempre foi “ao contrario” para a população negra dentro desse país chamado Brasil. O estado tem por obrigação criar politicas afirmativas, durante séculos houve politicas de exclusão ou limitação para as negras e negros.
Portanto quando vemos projetos, politicas especificas para negros e negras, elas são para inserção do negro dentro dessa sociedade que o exclui a mais de 5 séculos. E finalizo respondendo a pergunta acima “E se fosse ao contrario? Seria racismo?” Sim! Seria e foi racismo durante todo esse período, é doloroso dizer que hoje em pleno século XXI, ainda não conseguimos nos livrar do racismo dentro da sociedade e olhar a quantidade de pessoas que ainda questionam essas ações afirmativas, mostra o quando ainda temos de discutir e propor o tema racismo, como debate central para uma sociedade mais igualitária.
Desenrola, por Daniel Silva, é uma coluna do Mobiliza o Rolê!
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